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Adriana Arruda - Publicado em 05-12-2025 10:00
UFSCar e CNPEM desenvolvem nova memória baseada em materiais 2D
Pesquisa foi capa da revista ACS Applied Electronic Materials (Imagem gerada por Alisson Cadore)
Pesquisa foi capa da revista ACS Applied Electronic Materials (Imagem gerada por Alisson Cadore)
Pesquisadores do Departamento de Física (DF) da UFSCar e do Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), desenvolveram um novo tipo de memória eletrônica feita com materiais bidimensionais, que são estruturas extremamente finas, com espessura de poucos átomos. O dispositivo combina grafeno e nitreto de boro hexagonal (hBN) em uma configuração ultracompacta, de baixo consumo de energia e capaz de operar de forma estável em uma faixa ampla de temperaturas, que vai da ambiente até condições criogênicas, próximas do zero absoluto.

O estudo propõe uma mudança na forma como as memórias armazenam informação. "No armazenamento tradicional de dados, como nos chips de memória flash usados em celulares e computadores, a região onde a informação fica guardada, que chamamos de floating gate, fica enterrada em várias camadas de material isolante. Esse desenho funciona bem, mas já chegou ao limite: para ganhar velocidade, seria preciso tornar essas camadas ainda mais finas, o que acaba causando vazamentos de carga e perda de confiabilidade", contextualiza Victor Lopez-Richard, docente do DF da UFSCar e um dos autores do estudo.

A solução apresentada segue um caminho diferente. "Utilizamos materiais bidimensionais - grafeno e o hBN - e colocamos o floating gate na superfície do dispositivo, e não mais 'escondido' no interior da estrutura. Esse único eletrodo metálico cumpre três funções ao mesmo tempo: controla o dispositivo, armazena carga e permite apagar a memória sob demanda, algo que não existe nas arquiteturas tradicionais", explica.

Esse desenho garante maior precisão no controle elétrico e melhora o desempenho. O dispositivo permite programar, regravar e apagar os dados de maneira previsível e imediata. "É uma forma mais eficiente, versátil e compacta de guardar informação, aproveitando propriedades únicas dos materiais 2D para superar limitações das memórias convencionais", afirma Lopez-Richard.

Segundo o docente, essa estabilidade amplia o potencial de uso. "Do ponto de vista prático, isso significa que a mesma tecnologia pode funcionar tanto em dispositivos do dia a dia quanto em equipamentos avançados que exigem operação em temperaturas extremamente baixas", complementa o pesquisador.

Os dispositivos foram sintetizados pela equipe do CNPEM, em Campinas (SP), enquanto a contribuição da UFSCar se concentrou na simulação teórica e na compreensão da física por trás das funcionalidades.

Os autores consideram que os resultados abrem espaço para aplicações em memórias de alta densidade, eletrônica miniaturizada, sensores e novas arquiteturas de computação que exigem componentes compactos, responsivos e com baixo consumo energético. O trabalho também reforça o papel dos materiais 2D como candidatos promissores para tecnologias além do silício.

Os próximos passos incluem expandir a plataforma e avançar para integração com circuitos. "De um lado, explorar novas combinações de materiais 2D para ampliar funcionalidades, inclusive memórias ópticas e elementos neuromórficos. De outro, otimizar o protótipo e integrar esses dispositivos a circuitos reais: arrays de memória, blocos lógicos e plataformas de controle criogênico", projeta Lopez-Richard. 

O estudo foi publicado na revista ACS Applied Electronic Materials, com o artigo intitulado "Graphene Heterostructure-Based Non-Volatile Memory Devices with Top Floating Gate Programming", que pode ser acessado aqui. A pesquisa foi destaque de capa da edição. Além de Lopez-Richard, assinam o estudo Gabriel Labes Rodrigues, Ana Yoshida, Guilherme Selmi, Nickolas Tomi Kamijo Barbosa de Jesus, Rafael de Oliveira e Alisson Cadore, do LNNano; Igor Ricardo Filgueira e Silva, do DF; e Kenji Watanabe e Takashi Taniguchi, do Centro de Pesquisa em Materiais Eletrônicos e Ópticos, do Instituto Nacional de Ciência dos Materiais, Japão.